segunda-feira, 19 de agosto de 2013


Egito e Síria: dois exemplos da vergonhosa política pró-imperialista dos revisionistas do trotskismo

Quando escrevemos estas linhas, batalhas sangrentas estão ocorrendo no Egito e na Síria. No país dos faraós, o exército patrocinado diretamente pelo Pentágono massacra os apoiadores da Irmandade Muçulmana (IM), com um banho de sangue que já deixou mais de mil mortos. Foi imposto o toque de recolher e o Estado de Emergência como nos tempos de Mubarak. Os setores de “esquerda” que saudaram o golpe, apresentando-o como expressão da vontade popular contra os “islâmicos reacionários” da IM, agora fingem condenar a ação repressiva das FFAA, ainda que mantenham a caracterização geral que está em curso uma “revolução” no Egito. Já na Síria, o governo de Bashar Al-assad, apresentado pelos mesmos revisionistas com uma “ditadura sanguinária”, vem conseguindo derrotar os mercenários “rebeldes” financiados e armados pelas potências capitalistas, justamente porque tem amplo apoio popular. Em resumo, enquanto a canalha revisionista se coloca no terreno militar e político dos golpistas aliados da Casa Branca no Egito, na Síria se embloca com a reação “rebelde” aliada de Israel e das petromonarquias contra um governo de corte nacionalista burguês. Nestes dois países a luta de classes vem destroçando as frágeis posições destas correntes que enlameiam o nome do trotskismo, ao ponto delas começarem a acusar-se de estarem abandonando a canoa furada da fantasiosa “revolução árabe”.

Antes de entrar na polêmica propriamente dita em que a LIT acusa a CMI de Allan Woods de não mais se colocar em defesa da “Revolução Síria”, temos a obrigação de denunciar publicamente a posição dos morenistas frente ao massacre dos partidários da IM no Egito. Em uma declaração que se autodenuncia a partir do título distracionista – “Os militares não atacam apenas a reacionária Irmandade Muçulmana, mas a todo o povo” (sítio PSTU, 17/08) – a LIT afirma escandalosamente: “Ao mesmo tempo em que condenamos a matança do Exército e todas as medidas bonapartistas que tomam, valendo-se do prestígio ganho por haver destituído a Morsi, é necessário dizer com clareza: não à volta de Morsi! Não às mobilizações contra-revolucionárias e confessionais da Irmandade! Nenhum direito democrático nem de expressão para a Irmandade e seus líderes políticos enquanto se mobilizem pelo retorno de Morsi!”. Como se observa, depois de formalmente “condenar a matança”, da mesma forma que fez Obama com suas lágrimas de crocodilo, a LIT defende (fazemos questão de repetir) que os golpistas não permitam “Nenhum direito democrático nem de expressão para a Irmandade e seus líderes políticos enquanto se mobilizem pelo retorno de Morsi!”. O que significa esta política senão chamar as próprias FFAA a continuar a perseguir e assassinar os apoiadores de Mursi, como o exército acaba de fazer depois de desocupar a mesquita no Cairo que servia de refúgio para os feridos do massacre perpetrado no último dia 14, que deixou mais de 600 mortos. Talvez ouvindo os conselhos da LIT, o presidente “interino” do Egito, Adli Mansour, acaba de anunciar que irá decretar a ilegalidade do Partido da Justiça e Liberdade, braço político da IM, cassando-lhe o “direito democrático de expressão”!!!

Como a orientação pró-imperialista da LIT está sendo completamente desmoralizada no Egito, os morenistas preventivamente polemizam com outros setores revisionistas que começam a balbuciar uma tímida negação da linha política anterior, quando apresentaram o golpe como um “triunfo popular”. Na mesma declaração a LIT afirma: “Ante o golpe militar e o genocídio que o Exército executa, muitos ativistas e militantes de esquerda, dentro e fora do Egito, se perguntam justificadamente se a revolução já não foi derrotada. Nós da LIT-QI não vemos, no processo atual, uma derrota da revolução. Ao contrário, estamos presenciando uma tremenda revolução, sem dúvidas a mais poderosa que a história do Egito conheceu. No entanto, dentro desta colossal revolução, como em todas as revoluções, atua a contra-revolução. Nesse sentido, tanto a tentativa da Irmandade para retomar o governo, como os massacres e as medidas bonapartistas dos militares são tentativas para derrotar a revolução”. Transcrevemos literalmente a posição escandalosa dos morenistas, que em um verdadeiro delírio ainda teimam em apresentar como uma etapa da “revolução” o golpe militar de 3 de julho que impôs uma ditadura sanguinária contra o povo egípcio, colocando um sinal de igual entre os generais golpistas treinados e financiados pelo Pentágono e os militantes da Irmandade Muçulmana, mortos e assassinados pelos golpistas que depuseram um presidente eleito, mantendo-o preso e incomunicável até hoje!

A desmoralização da LIT, incapaz de sustentar suas posições escandalosas no Egito para qualquer militante anti-imperialista, também vem se aprofundando na medida em que os “rebeldes” mercenários financiados pelas potências capitalistas são derrotados na Síria. Tamanho desespero chegou ao ponto da corrente morenista se ver obrigada a fazer uma polêmica com a CMI de Allan Woods (Esquerda Marxista no Brasil) para reclamar da sua “deserção” na defesa da fantasiosa “Revolução Síria”. Em polêmica intitulada “Defender a Revolução até o fim ou contribuir para a sua derrota? A posição de Alan Woods e de sua corrente internacional sobre a Revolução Síria” (sítio LIT, 13/08), os morenistas afirmam que “A maioria da esquerda, começando pelos irmãos Castro e o finado presidente venezuelano Hugo Chávez, se colocou abertamente ao lado do ditador Bashar Al Assad e seu regime. Alan Woods (que apoia o governo chavista, e aparecia como assessor de esquerda de Chávez) e a organização que ele dirige a nível internacional, a CMI, mudou o rumo de suas posições partindo do pressuposto de que havia se colocado, em princípio, a favor da Revolução Síria”. Na verdade, Woods e sua corrente já estavam cruzados por esta contradição desde 2011, quando a OTAN atacou a Líbia e Chávez defendeu Kadaffi. Como advertimos na época: “Apoiar os supostos ‘rebeldes líbios’ como faz a esquerda revisionista seria o mesmo que se somar às orquestrações dos golpistas venezuelanos que também se dizem ‘inimigos da ditadura’, já que tanto na Líbia como na Venezuela essas forças políticas e sociais representam a contrarrevolução, assumindo o objetivo de liquidar conquistas históricas do proletariado. Por essa razão, não há espaço para disputar este suposto ‘movimento de massas’ com as direções burguesas made in CIA, como pateticamente defendem setores da ‘esquerda’, em nome de ‘superá-las no calor da luta’. A ofensiva contra Kadaffi como foi denunciada pela LBI em voz solitária desde o início da crise líbia não é nenhuma ‘ação do movimento de massas’, são mobilizações armadas sob a direção de mercenários, monarquistas e arrivistas a soldo da Casa Branca, contratados para vender o país às transnacionais ianques, assim como eram os golpistas em abril de 2002 na Venezuela, chamados de ‘esquálidos’, apesar da mídia imperialista vender que estes agiam como porta-vozes de um amplo ‘movimento popular’, da mesma forma como fazem agora. Exemplar para colocar a nu essa política contrarrevolucionária de apêndice do imperialismo na Líbia é a posição da corrente dirigida por Allan Woods (CMI), que acaba lançar um artigo com o sintomático título: ‘Venezuela e Líbia: não é um 11 de abril, mas um 27 de fevereiro’ onde afirma: ‘Devemos ser claros: o que estamos vendo na Líbia e no resto do mundo árabe não é um 11 de abril de 2002, quando um golpe de Estado reacionário foi justificado mediante a manipulação dos meios de comunicação, mas um 27 de fevereiro de 1989, um levante como o Caracaço, em que os governos usam o Exército contra manifestantes desarmados. Ao mesmo tempo que nos opomos a intervenção imperialista, devemos ter claro de que lado estamos: do lado do povo líbio contra o regime de Gadafi’ (El Militante- Argentina, 04/03). Woods e boa parte do arco revisionista que saúda febrilmente a tal ‘revolução árabe’ é também partidária da farsesca ‘revolução venezuelana’ comandada por Chavéz, o ‘Kadaffi do Século XXI’. Seria cômico se não fosse trágico ver essas mesmas correntes pseudotrotskistas que saúdam as ‘mobilizações contra a ditadura na Líbia’, na verdade ações contrarrevolucionárias apoiadas e financiadas pela CIA que nada têm a ver com ‘levantes populares’ serem acossadas e desmoralizadas por manifestações supostamente ‘democráticas’ patrocinadas pela direita golpista na Venezuela, inspiradas nos ventos de ‘mudança’ trazidos do Oriente. Para serem coerentes, esses chavistas deveriam se unir aos ‘esquálidos’ reacionários da direita golpista na Venezuela, assim como estão unidos aos ‘esquálidos’ monarquistas do rei Idris na Líbia, para ‘derrotar as ditaduras de Chávez e Kadaffi’, pois assim a mídia imperialista define os regimes nacionalistas burgueses nestes dois países” (Jornal Luta Operária, Nº 210 - 1ª Quinzena de Março/2011). Como se observa, desde esta época estava claro que o conto da “revolução árabe” não se sustentaria por muito tempo! Agora na Síria, Woods e a CMI trataram de fazer sua “mea culpa”, ainda que mantenham sua política pró-imperialista geral, como vimos no Egito ao apoiarem golpe militar, tanto que depois do massacre do dia 14/08, a Esquerda Marxista lançou um artigo intitulado “Egito: duas faces da reação, o Exército de El-Sissi e a Irmandade Muçulmana de Morsi” com uma posição idêntica a da LIT, em que afirma: “O objetivo da Irmandade Muçulmana é restabelecer Morsi na presidência para enterrar a revolução egípcia ou levar o país à guerra civil prolongada. O objetivo do exército é estabelecer o terror sangrento e desmontar a revolução aterrorizando todo o povo” (sítio EM, 15/08).

Voltemos, porém, à polêmica da LIT com a CMI sobre a Síria, transcrevendo-a literalmente no ponto que demonstra o desapontamento dos morenistas. Segundo a LIT “A seguir, resumimos os argumentos usados por Alan Woods para justificar sua posição com extratos de seu artigo: 1. ‘O movimento na Síria começou como uma revolução popular com apoio de massas. Se esse movimento estivesse armado com um programa genuinamente revolucionário, poderia ter conquistado os setores da sociedade que apoiavam Assad por falta de alternativa. Entretanto, na falta de uma direção clara, o movimento foi sequestrado por elementos reacionários que o empurraram para as mãos de uma direção sectária’; 2. ‘Aliados regionais dos EUA, os baluartes da reação, Qatar e Arábia Saudita, despejaram dinheiro, armas e mercenários para a Síria desde o primeiro dia. Seu objetivo não era, em absoluto, ajudar os rebeldes que lutavam por mudanças na Síria, mas sim, pelo contrário, conter os elementos revolucionários e transformar o que começou como um levante popular, numa guerra civil com conotações sectárias’; 3. ‘Na medida em que toda a situação se militarizou, a luta foi privada de todo o conteúdo revolucionário. Quem controlava o dinheiro e as armas foi capaz de impor condições. Os salafistas e jihadistas contrarrevolucionários, generosamente apoiados com o dinheiro e as armas de seus mecenas multimilionários de Riad e Doha, tomaram o controle. Isso determina a natureza da chamada oposição’; A partir desses argumentos, a conclusão apresentada é a seguinte: ‘a revolução síria sofreu uma derrota’, e tudo se resumiria agora a uma intervenção imperialista contra o país através de seus aliados. Em outras palavras, para Alan Woods, não importa qual lado vença a guerra: a tarefa imediata dos revolucionários na Síria seria apenas a de esperar por dias melhores” (Defender a Revolução até o fim ou contribuir para a sua derrota? A posição de Alan Woods e de sua corrente internacional sobre a Revolução Síria. Sítio LIT, 13/08). O que está claro é que a política da CMI (que é em linhas gerais a mesma da LIT sobre a “revolução árabe”) não mais se sustentava e sua proximidade política (que inclui negócios) com o chavismo a forçou a ser mais comedida e minimamente fiel à realidade na Síria. Mas a LIT persiste em manter seu delírio de apresentar os “rebeldes” como combatentes revolucionários, chegando a pedir que Obama libere mais armas para os mercenários!

O mais escandaloso vem na parte final da polêmica, quando a LIT novamente conclama os governos imperialistas e Israel a armarem os “rebeldes”, criticando a CMI por não adotar esta posição escandalosa. A LIT declara “Deixamos para o final o que foi a justificativa do texto que criticamos: as declarações de Obama no sentido de que iria subsidiar diretamente a oposição síria com armas e recursos. Declarações após declarações que não se cumpriram. Porém, para Alan Woods isso é um escândalo, pois significaria a intervenção imperialista. Nós denunciamos precisamente o contrário. O imperialismo está intervindo faz tempo no conflito sírio e o tem feito principalmente a favor do regime. O embargo de armas até agora só beneficiou a ditadura, que segue se armando através de países como a Rússia e o Irã, dos subsídios de combustível da Venezuela e do apoio econômico da China, e que conta com uma verdadeira intervenção estrangeira, a do Hezbollah. Isso porque a política do imperialismo, que até hoje não mudou, tem sido a de que a oposição negocie uma transição com o regime, que acabe deixando intactas as bases do regime atual, mas sem a presença de Bashar Al Assad. O que preocupa o imperialismo é a instabilidade da região, que Assad vinha garantindo nos últimos 40 anos, sendo um dos pilares, junto com o regime egípcio, da sobrevivência do Estado de Israel. Por outro lado, ‘os aliados’ (como são definidos por Alan Woods) mais diretos do imperialismo na região, Arábia Saudita e Qatar, estão financiando facções islamitas, com o claro objetivo de desvirtuar a revolução e debilitar as massas sírias. Diga-se de passagem que nem o Qatar, nem a Arábia Saudita, jamais enviaram armamento pesado às milícias que apoiam, o que demonstra que sua intenção real está longe de ser a derrubada rápida e efetiva do regime. E por que os rebeldes sírios não teriam o direito de receber armas dos EUA ou da Europa? As massas sírias têm direito a se armar, venham as armas de onde vierem” (Defender a Revolução até o fim ou contribuir para a sua derrota? A posição de Alan Woods e de sua corrente internacional sobre a Revolução Síria. sítio LIT, 13/08). “Justiça” seja feita, a LIT sempre se colocou ao lado dos “rebeldes” armados pelas potências imperialistas e Israel contra o governo de Assad e reclamou abertamente do suposto “tímido” apoio da Casa Branca aos mercenários sírios, acusando Obama de dar sobrevida ao regime da oligarquia Assad!

Como depois de três anos de guerra civil o povo sírio não se dobrou aos ditames do imperialismo, a LIT chegou a organizar em maio desde ano junto com ONGs pró-imperialistas um “Dia Global de Solidariedade com a Revolução Síria”, cujo eixo foi reivindicar dos EUA, da União Europeia e seus títeres mais armas pesadas para os “rebeldes”, declarando na época: “É necessário exigir de todos os governos do mundo, começando por aqueles países da região que são parte da revolução, como Egito, Tunísia e Líbia, que rompam relações diplomáticas e comerciais com a ditadura de Assad e que enviem aviões, tanques e armas pesadas, medicamentos, alimentos e todo tipo de apoio material para as milícias rebeldes, para que estas possam derrotar e acabar com este regime que oprime o povo sírio” (Cercar a Revolução Síria com solidariedade ativa - Suplemento Correio Internacional, 22/05). Tratou-se de um verdadeiro chamado à intervenção militar na Síria em socorro aos “rebeldes” não só pelos exércitos controlados pelo Pentágono no Oriente Médio e Norte da África (Egito, Líbia e Tunísia), mas pelo próprio imperialismo, já que “todos os governos do mundo” obviamente inclui EUA, Israel, França, Inglaterra e Itália!!! O fato da CMI não se somar nesta “empreitada” reacionária decepcionou a LIT, já que a corrente de Woods sempre esteve ao lado da OTAN e dos “rebeldes” financiados pelas potências capitalistas na Líbia e também no começo do conflito na Síria! Em resumo, vimos na polêmica da LIT com a CMI um típico exemplo do “sujo falando do mal lavado”, porém a grande lição político-programática que os genuínos leninistas e os combatentes anti-imperialistas devem abstrair desse debate é que tanto no Egito como na Síria temos dois exemplos nítidos da desastrosa política dos revisionistas do trotskismo nos dias atuais.